Coronéis eletrônicos, mídia e política em Sergipe
Texto de Paulo Victor Melo* disponível no site : http://www.infonet.com.br/paulovictor/ler.asp?id=141017&pagina=1
Políticos
usam rádio e TV em benefício próprio
- Senador, o microfone é todo seu.
Com essas palavras um repórter da Rádio Rural de
Concórdia, em Santa Catarina, iniciou uma entrevista, em 1965, com o então
senador Atílio Fontana.
A resposta do à época parlamentar catarinense foi
simples e direta:
- Não só o microfone, meu rapaz, mas a rádio toda.
- Não só o microfone, meu rapaz, mas a rádio toda.
Mais que cômica ou folclórica, a declaração de
Atílio Fontana - 48 anos depois - continua emblemática do que representa o
controle dos meios de comunicação por políticos no Brasil.
Enraizado na cultura e na prática política
nacional, o vínculo entre propriedade de mídia e políticos é um fenômeno que
permanece atual. Historicamente, meios de comunicação, em especial rádio e
televisão, são controlados por poucos grupos familiares. Não coincidentemente,
essas famílias são também os mesmos grupos oligárquicos da política local e
regional.
Com base em dados oficiais, o projeto Donos da
Mídia revelou que mais de 270
políticos são sócios ou diretores de veículos de comunicação em todo o país.
É aí que surge uma das principais características
da política brasileira atual: o coronelismo eletrônico, prática em que
políticos utilizam-se de concessões públicas de rádio e TV para promover
interesses próprios e construir uma boa imagem perante a sociedade. Assim como
no velho coronelismo, a moeda de troca continua sendo o voto. Só que não mais
com base na posse da terra, mas no controle da informação, na capacidade de
influenciar na formação das opiniões.
Como no Brasil todo ano é eleitoral ou
pré-eleitoral, ou seja, as disputas eleitorais sempre estão em jogo, os
coronéis eletrônicos utilizam os meios de comunicação para promover seus
aliados, hostilizar os adversários e cercear qualquer manifestação contrária
aos seus interesses. Iniciam-se verdadeiras guerras particulares com armas
públicas (afinal, é sempre bom lembrar que rádio e TV são concessões públicas,
que têm prazo de validade e princípios constitucionais a seguir).
Uma verdadeira afronta ao Código Brasileiro de
Telecomunicações, de 1962, e à Constituição Federal de 1988. Tanto o Código,
que regula o rádio e a TV no Brasil, quanto a Carta Magna proíbem que políticos
desempenhem a função de diretor ou gerente em empresas de rádio e TV, ou ainda
que mantenham contratos, exerçam cargos ou emprego remunerado nestas empresas.
Sem dúvida, Sergipe é um estado que ilustra com
fidelidade esta situação. Velhas e nem tão velhas assim lideranças políticas
locais (ou grupos familiares, se preferir) são conhecidas, dentre outras
coisas, por terem o controle da propriedade de grupos de comunicação, tanto de
radiodifusão quanto de mídia impressa.
Os mais antigos foram “beneficiados” na farra da
distribuição de concessões em troca de apoios político-eleitorais, que teve o
seu auge no final dos anos 1980, quando o Ministro das Comunicações era ninguém
menos que o baiano Antônio Carlos Magalhães, um dos maiores controladores de
rádio e TV da história do país.
Outros, a partir do poder econômico do qual
desfrutam, perceberam na comunicação um instrumento estratégico de conquista de
poder político. E têm conquistado.
Não só os políticos que são sócios ou diretores de
empresas de rádio e TV usam dos meios de comunicação para autopromoção. Basta
ter um programa de rádio ou um espaço mínimo na televisão e ser aliado do
proprietário da emissora.
Exemplo disso é o suplente de deputado estadual,
Gilmar Carvalho, que, na semana passada, teve uma Representação impetrada pelo
Ministério Público Eleitoral por “promover propaganda eleitoral antecipada” em
seu programa de rádio matinal. O suplente de deputado veiculou uma música, com
letra de sua própria autoria, em que exalta as suas “qualidades” e ações
“públicas”, numa clara indução a uma possível candidatura em 2014.
Mas o uso político de uma emissora de rádio ou TV
(concessão pública) nem sempre acontece de forma escancarada como fez Gilmar
Carvalho. Se analisarmos com atenção os temas que estão em destaque neste
início de ano em Sergipe – como Proinveste, situação financeira da capital,
votações na Câmara de Aracaju, disputas na Assembleia Legislativa e
articulações e diálogos com vistas às eleições de 2014 – perceberemos que as
abordagens das matérias e os focos das análises variam de acordo com a
orientação e opinião do político que está à frente da rede de comunicação.
Sai perdendo o jornalismo independente. Sai perdendo
o público, que tem direito a uma informação isenta de coloração partidária. Sai
perdendo a democracia.
Com
a proximidade das eleições no próximo ano, essas tendências nas coberturas
sobre política e políticos se aprofundarão e a população poderá observar com
maior nitidez como se materializa o coronelismo eletrônico em Sergipe.
*Jornalista, mestrando em Comunicação e Sociedade na Universidade Federal
de Sergipe. Tem experiência com jornalismo sindical, mídias públicas e
políticas públicas de comunicação. Coordenador do Intervozes – Coletivo Brasil
de Comunicação Social.
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